Newcoisa #83: Tudo métrica e rima e nunca a dor*
Newcoisa #83: Tudo métrica e rima e nunca a dor*
A incrível escritora (leiam!) Aline Valek compartilhou hoje um tuíte que dizia “Escrever não tem segredo. Senta e escreva. Não importa que no primeiro momento haja erros, não faça sentido... A coisa toda está em escrever SEM MEDO. Depois você lapida, amadurece o que tem de amadurecer, exclui, adiciona, enfim: escreva e escreva”. E eu tive uma invejinha dessa ideia de sentar, escrever e polir depois. Quem dera. Se eu não tiver a primeira frase redonda, encaixadinha, adequada, não sai de mim nem bilhete pra vizinha. A frase não precisa ser bonita, enigmática etc. mas ela deve ser a frase "certa" para aquele texto específico, cada palavra insubstituível e no seu lugar irremovível. O que eu não posso explicar é como eu sei que é a frase certa, rola uma espécie de clique. Muitas vezes eu tenho uma ideia de texto (como sei q é, risos, aí depende do click) e fico um tempão polindo a frase na minha cabeça antes de escrever em qualquer lugar, ou mesmo gravá-la no zap no grupo eu comigo mesma. Depois da frase pronta e registrada, diminui a minha preocupação de perder o texto. Se ela chama, ele quase sempre vem. Não que eu seja um modelo de escrita ou algo assim. A verdade é que eu não tenho muita história pra contar, personagem pra apresentar, ideia pra partilhar. O que eu escrevo é o como eu escrevo.
Se você escreve de uma forma que faz sentido (ou tem curiosidade sobre isso), assiste esse vídeo do canal Drops da Fal, são 4 poetas (Paulo Candido (A canção da borboleta ausente), A. Bernardo Cerântola (Canteiro de formigas), Iata Anderson D'Gerais (Ecos do que ouvi e amei) e Fal Azevedo (Todo mundo adora Saturno) falando do seu processo de escrita.
Os domingos tem sido a constatação de que não há tempo de descanso e prazer o suficiente em um mero fim de semana. Já acordo triste porque vai dar tempo pra o quê? ver um ou dois jogos, fazer comida mais caprichada, ler umas páginas, assistir GoT dos dragões e, pronto, já é hora de trabalhar. Queria ir à praia, mas é meio tanque de gasolina.
Tem gente de quem eu gosto bastante, mas com quem acho difícil conversar, especialmente por escrito, porque sempre fico com a impressão de que a pessoa não lê com atenção o que escrevo e conduz suas respostas de maneira independente ao meu argumento.
Sim, amiga, estou esperando o alguém que procure minha mão e entrelace os dedos nos meus sempre que ouvir o refrão de Exaltação à Mangueira, que tenha um interesse sexual, displicente e reconfortante, pelo meu corpo, estando constantemente a tocar, roçar, beijar, afagar algum pedaço de pele sem dar por isso, que se banhe no mar de mim, que sorria com minhas conversas repetidas, que tenha desfiladeiros na alma em que eu me perca, que cheire a gentileza, madeira e livro novo, que saiba coisas esquisitas, que se faça saudade e seja certeza de poder contar, que tenha alguns calos, na mão, na alma.

Por aqui são muitos os fantasmas. Eles fazem uma algazarra danada e não me deixam dormir quase nunca.
Na escrivaninha: duas velas frescoiosas nunca acesas, um pote com lápis de cor, um copo do Flamengo com canetas, um caldeirãozinho com conchas, um porta moeda vindo de Paris, uma arvorezinha de ametista, uma carta envelopada, uma carta abandonada, adesivos para colocar na carta semi-pronta destinada à Fal, duas pilhas novas, um amor mal resolvido, blocos coloridos, o aparelho de pressão, um tanto de saudades, um susto, dois medos, três livros da Ana Martins Marques, o diário que voltei a escrever, uma piranha, um ovinho de quartzo rosa, papéis de carta. Nem vou falar das gavetas para não constranger vocês.
Procurei, para reler, esta crônica de um português que me agrada: Nunca sabemos do que são feitos os outros - diz ele. Até concordo, mas escuto o que ele não quis dizer: também não sei do que sou feita. E me di(e)sfa(r)ço.
Sinto muita falta da luz de Lisboa.
Voltei a postar com alguma regularidade no Cais de Saudades, tem uma carta para a Fal (Efúgio), alguns posts de citação (primeiras palavras), devaneios do cotidiano (Deglaçando Sentimentos, Deslizes, Correspondentes).
*Caetano: O Quereres