Newscoisa #09: Garrincha e outros desequilíbrios
Olha as coisas esquisitas que eu tenho pra lembrar. Eu gosto de como você pega a correspondência. Acho bonito o processo todo, você abre a porta do prédio, aquele seu chaveiro esquisito balançando uma coleção incrivelmente grande e organizada de chaves, você se curva e abre a caixinha do correio, pega tudo com a mão esquerda, e vai, em passos largos e distraídos, pro elevador. Não olha nada que leva na mão. Chega em casa, abre a porta, tira o casaco, guarda carteira e chaveiro na gaveta do aparador, e, aí sim, concentrado, vai lendo por cima do óculos os remetentes. Gosto da forma como inclina a cabeça quando está interessado. Gosto como franze a testa e passa a mão livre no cabelo. Gosto como vai separando entre os dedos, todos os envelopes, como um arquivo de critério pessoal. Mesmo depois que nós formos um ontem, eu vou te escrever cartas, só pra te adivinhar.
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Ganhei esse presente tão gostoso que oscilo entre a vontade de mostrar pra todo mundo e guardar só pra mim (clica na imagem que vai). Todo dia, desde então, coloco pra tocar e danço um pouquinho. Mantenho o corpo pronto pros abraços.

"Depois que o tempo passar
For sacudida a poeira
Nas voltas que o mundo dá
Vai que cai na sexta-feira
Deixa essa gira girar
Ela é que guia o compasso
Quando isso tudo passar
O que não vai faltar é abraço"
Se cair na sexta-feira, eita, eu me acabo.
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Eu tenho a impressão que meu pulso é meio o pé de Harriet. E obrigada Caio Fernando Abreu, por essa pecinha no quebra-cabeça que eu viria a ser.
A única confissão possível: se não doesse, que bonita era a saudade.
Educação Sentimental: Maria Moita.
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Achei que alguém por aqui podia precisar de um conselho. Como essa é uma das poucas coisas que não sou boa em dar (#vulgarsemsersexy), procurei quem tivesse um bem bom. Fica a dica: cultive seu Mister Wong.
“Além do controlado Dr. Jekyll e do desrecalcado Mister Hyde, há também um chinês dentro de nós: Mister Wong. Nem bom, nem mau: gratuito. Entremos, por exemplo, neste teatro. Tomemos este camarote. Pois bem, enquanto o Dr. Jekyll, muito compenetrado, é todo ouvidos, e Mister Hyde arrisca um olho e a alma no decote da senhora vizinha, o nosso Mister Wong, descansadamente, põe-se a contar carecas na platéia… Outros exemplos? Procure-os o senhor em si mesmo, agora mesmo. Não perca tempo. Cultive o seu Mister Wong!”
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Já foi mais fácil querer antes de saber.
Sabe aquele lance: “sou legal, não estou te dando mole”? Então, no meu caso, eu sou legal e eu estou te dando mole.
Uma revelação: o afeto tem sotaque.
Meu pai me aperreia que eu escrevo pra poder ler. Ele não tá errado.
Pra sair valsando, hoje, só mesmo um vestido cheirando a guardado, porque decotes, acho, estão bem em baixa. A gente encontra roupa curta, fenda, cintura baixa, blusa curta, roupa justa. Mas decote fundo, que é bom, nem pelamor.
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Vai que cola:

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Eu tinha preparado tudo para a última vez. Dormir de dedos entrelaçados. O olhar-te demorado, de manhã cedo, antes de você acordar. As poucas palavras no trajeto. O abraço desajeitado na estação. Ia ser cálido. Escolhi e ensaiei esta palavra. Cálido sobe morno do peito e desliza suave na língua. Cálido não tem arestas. Virar devagar, a mala pesada bambeando na subida da calçada, a voz na cabeça insistindo: não olha pra trás, não olha pra trás, coloca a mala no bagageiro, entrega a passagem, não olha pra trás. Olhar. O embaçado do meu olho e o embaraçado do seu rosto. Meios sorrisos. A mão sobe em um aceno. Acolheríamos a saudade como se ela já fosse antiga. Eu tinha tudo preparado. Pena não ter combinado com os russos.
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Tem coisa tão bonita que devia ser verdade.
Já que tá longe vacina, viagem, futuro, fica aquele desejinho maroto: “se deus, em nome da alegria, me desse os olhos teus pra minha companhia”.