Newscoisa #25: Me chama
Newscoisa #25: Me chama
"Não é fácil não pensar em você
É estranho não te contar meus planos"

Nem sabe quantas vezes passou por aquela esquina. Antes. Não era destino, nunca foi intenção. Distraída do futuro do sentir, passava por ali pelos acasos, apenas. Talvez tenha sentado no meio fio, duas, três vezes, pra descansar ou apreciar o bonito ipê do jardim da frente. E seguia, que era de viagens. Não podia garantir se aquela era a primeira vez que o portãozinho batia, sem ferrolho, se era a primeira vez que a porta estava aberta, a primeira vez que a luz estava acesa, a primeira vez que, da calçada, via-se as cortinas, nas janelas, balançando no entra e sai do vento que incita a fazer o mesmo. Foi tudo por causa do sussurro. Ela podia garantir que ouviu o convite. Foi entrando. Foi se assombrando. Que a casa era dela. Ou quase. Tanta coisa que ela (se) reconhecia. Tentava descobrir um não, fazia experimentos, entrava repentinamente em um ambiente, virava de sopetão, testando, esperando não encontrar o que esperava encontrar em determinado cômodo e, pronto, lá estava. Nem sempre no lugar exatinho que ela deixaria, mas estava e, pensando bem, algumas vezes melhor arrumado. O cheiro de alho e azeite na cozinha, Na estante, os seus Verissimos. E era o Paulinho da Viola que girava na radiola? Era. Os pelinhos do braço em arrupio. A casa é conforto e promessa e o que é aquilo que se revira dentro dela? Desejo. Tem aquela poltrona. Ela pensa em sentar. Ela quer se encolher ali. Aninhar-se. Sabe, institivamente, que vai caber, certinha. E se? Ela apura o ouvido. Ainda há o sussurro? Ainda há o convite? Ainda bate o vento nas quinas da casa pedindo habitante? O sol se põe, morno e indiferente, e ela ali, na soleira, no seu sem saber morar.
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É que ficou mais fácil respirar quando estou debaixo d’água.
Se me ferir a pele, eu sangro, mas é o sangue quem sempre esteve aqui, não o corte.
Não há Verissimo que dê conta de tanta ausência sua em mim.
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Eu não sabia você. Não sabia que podia querer caber em uma mão. Não sabia pequenas frases que se completam no dito do outro. Não sabia que alguém podia cheirar a peixe e azeite e vontades. Não sabia que se podia rir a mesma risada. Ou desejar amortecer dores que até ontem nem se conhecia a sombra. Eu não sabia você. E tudo que eu não sabia era um vazio que eu me acostumei a chamar serenidade. Eu nem percebi quando as coisas foram pedindo você. Não eu, as coisas, digo pra me convencer. Uma foto pedia seu olho. Uma música pedia sua escuta. Um texto pedia sua leitura. Uma roupa pedia seu toque. Os copos e garfos pediam seus lábios. Minha pele pedia teu olho, mão, língua. Ela, não eu. Escrevo longos textos com coisas que não posso dizer, que sei que não devo publicar. Não tenho exigências, tenho vontades. Não tenho expectativas, tenho desejo. E saudades. Tanta saudade.
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Eu estou aqui pra você, sabe. Pra ouvir. Pra empurrar. Pra confortar. Pra gargalhar. Pra beber. Pra sonhar. Pra desviar. Pra saber. Pra entender. Pra confundir. Pro que vier. Mas eu preciso saber se eu devo estar aqui. Ou então me devolve aí o coração, ele é enfeite estranho pra você deixar de troféu na estante.