Newscoisa #27: Suspeitando. Suspirando. E outras Cebolinhices
Newscoisa #27: Suspeitando. Suspirando. E outras Cebolinhices.
O que eu te ofereço é uma cama de lençóis frios e um corpo quente. Um passeio de mãos dadas. Pés descalços descansando no teu colo. Um lugar em comum. Uma madrugada, um bar que já está quase vazio, um copo pros dois. Uma conversa que não termina e já não se sabe onde começou, com silêncios expressivos e gargalhadas como vírgulas.
O que te ofereço é um passado que é refúgio. O encontro ansioso em uma rodoviária. O show com roupas azuis. Um abraço em que a gente se esquece nele. Mãos bandoleiras. Endereços trocados, cartas, meias palavras, toda vontade. Um sorvete provado nos teus lábios. Inocência. Um carnaval antigo, um asilo futuro. Contar histórias em que cabemos - justinho, juntinhos - nelas.
O que te ofereço são beijos. Molhados. Rápidos. Demorados. Na boca. Na pele. Sugando. Lambendo. Suave. Forte. Com pequenas mordidas. Ou grandes. Em despedida. Em reencontros. Em descobertas. Virtuais. De saudades. De convites. Beijos. Ou sopros. Morder teu dedão. Cutucar. Te agarrar de repente. Te devorar lentamente. Mandar mensagens absolutamente banais em horas pouco apropriadas. Nudes. Da alma, quase sempre. E a risada por mais esta piada besta. Bobó. Chaleira. Champanhe.
O que te ofereço é o encontro em um aeroporto. Um intervalo. Um dia pra vadiar. Ouvir Bethania. Com as barbas de molho. Nenhuma promessa. Nenhuma espera. Nenhuma dúvida. Um quarto sem lá fora. A moldura de uma cama. Uma citação incompleta de Vinícius. Ler teus livros. Bagunçar tua mesa. Tuas ideias, Ou teu peito.
O que te ofereço são lugares imaginários. Passar as manchetes dos jogos. Deixar lembretes de afeto. Anestesiar com álcool. Cauterizar com ferro em brasa. Adormecer temores. Acender fogueiras. Uma pele macia. Um sorriso largo. Colecionar belezas e depositar na tua janela. Palavras para dizer. Desejos engarrafados.
O que te ofereço é a paisagem da minha varanda, um passeio pela casa, pelo corpo, pelos sonhos. Um suspiro. Outro. Uma massagem cardíaca. Brindar o possível, enroscar o teu cabelo entre os dedos enquanto nos recostamos no sofá e vemos um programa antigo da tv. A risada na mesma hora, o gosto pelas mesmas passagens, um certo espanto com as coincidências. O conforto.
O que te ofereço é uma brecha. Uma gaveta pras suas cuecas. O lado direito da cama. A porta sempre entreaberta. Nenhuma sombra de futuro. Mimo, dengo, chamego, xero. Meu sotaque. Chá de hortelã. Velhas receitas como novas: limão, mel e cachaça. Presença na madrugada. Uma banda sonora. A mesma piada.
O que te ofereço é minha mochila leve. Fogo e gasolina. Companhia e vontade. Um telefonema no começo da noite só pra dizer: dá uma chegadinha na janela e olha a lua. Um cartão de aniversário feito de recortes de revista. Longas dedicatórias nos livros. Uma mensagem no celular com um trecho inteligível de Lacan. Um bilhete sobre nada, só pelo prazer de tuas mãos tocarem o mesmo papel que as minhas.
O que te ofereço é viagem. Minha ausência. Uma saudade do que não teremos. Uma vontade de mais. Viver mais, trepar mais, saber mais, rir mais, conhecer mais, partilhar mais. Entontecer um pouco. O que te ofereço é clareza. Aproveitar o enquanto. O possível. Tornar-me um sorriso perdido nos teus olhos. Permanecer na tua pele. Ser cheiro. Um apelido bobo. Promessa de monogramas e abotoaduras. Figurinhas que fazem sorrir. O que te ofereço é uma vitrola, um disco, um samba. Ou dois. Um despertar com desejo, um amanhecer de ternuras, demorar-se na cama em cafunés. Um café. Outro. Mais. O quê? Qualquer coisa. Mais você em mim.
O que te ofereço é um quem sabe, companhia na cozinha, tempo e fogo, temperos, os sentidos se aguçando. Azeite, azeite, azeite. Uma taça de vinho. Um cheiro no cangote. Um álbum de fotografias. Uma mordida no nariz. Encostar a cabeça em teu peito, enlaçar mãos e chamar pra dançar um bolero. Sem música.
O que te ofereço é um estar aqui, companhia no trânsito, no show, na viagem, um fim de semana na serra, um feriado na praia, um ombro encostado no teu ombro no cinema, o silêncio depois das luzes acesas, a escuta das miudezas cotidianas, a acolhida das dores quase esquecidas que se fazem inesperadamente presentes e imensas. O que te ofereço é um dizer que sim, que pode, que vai. Um empurrão.
O que te ofereço é termos um ritual. Ou dois. Um dia juntos. Ou dois. Ou mais. Um lance. Um romance. Um rala e rola. Um rolo. Um filme. O relógio sem ponteiros. O que te ofereço é um abismo. Um mergulho. Um vôo de trapezista. Sem rede. Também conhecido como um encontro.
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Meus alunos costumam dizer que “na prática a teoria é outra”, ideia que refuto com veemência, em todos os campos. Melhor: que refutava com veemência em todos os campos e, agora, rejeito em quase todos os temas. Menos nesse, de suspiros, suspeitas e surpresas. Venho queimando a língua nesses últimos meses que não é brincadeira. Podia dizer que a culpa é sua, mas não tem culpa quando se trata de desejo. Objeto causa, talvez.
Palavras que eram jeitosinhas juntas agora são uma verdade que dói no corpo. Reescrevo porque é o jeito de unir a luciana que fui com a que você anda inventando em mim.
Eu tateava, tentando falar o bem querer. Você disse: vem. E eu estou indo. Estou indo sem medo. Sem reservas. Sem colete. Eu chego rápido demais, avisei. E você: vem. E eu vou. Sabendo sua mão na minha e pouco mais que isso.
Eu faço de conta que disfarço enquanto anuncio anseios em enormes outdoors na beira da sua estrada. Não há nudez maior que a esperança.
E tem o que diz Manuel Antonio Pina (em "Ainda não é o fim nem o princípio do mundo: calma é apenas um pouco tarde"):