Newscoisa #46: Rosebud, rosebud, mas não deu tempo ver tudo pro Oscar
Newscoisa #46: Rosebud, rosebud, mas não deu tempo ver tudo pro Oscar
For me, the cinema is not a slice of life, but a piece of cake.
(Alfred Hitchcock)
Queria mesmo era estar no Madadayio conversando miolo de pote. Bora agendar isso, Carla <3
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Li, hoje, no twitter uma pessoa dizendo algo como: não sei pra quê o desespero de ver os filmes do Oscar antes da premiação, vocês vão votar? Rimos muito, dei unfollow (brinks, eu não seguia, era retuitado, etc). Faz muito, muito tempo, que eu procuro assistir o máximo de filmes que eu consigo antes da cerimônia. Eu não voto, mas me permite xingar com mais propriedade. Este ano os efeitos da infinitena me pegaram e me senti muito imobilizada, dolorida e, principalmente, sem interesse em tanta coisa que costuma me mobilizar. Não vi quase nada. Aí, aos 45 do segundo tempo, bateu a febre.
Nomadland é meu tipo de filme: lento, cabeçudo, perdas, pessoas envelhecendo, ausências, encontros, paisagens maiores que a tela. Mas devo assumir, para horror dos amigos e risco de unfollow, que já faz um tempo que não me importo com os rumos dos personagens da Frances McDormand. As coisas acontecem (ou não) e eu só: ok. Além disso, não curti alguns cortes do filme e a cena da chuva, na hora que ela parte da casa aconchegante da família, foi tão clichê que sou desproporcional à elegância contida da direção. Vai ganhar, merece, mas nhé, não é o “meu” filme do ano.
Meu filme da temporada é Druk. Por favor, um Oscar de melhor bebedeira pra galera indo buscar bacalhau na unha. Filme sem moralismo, nem rodado, roteiro alinhadinho e Mads, que mulher! Outras considerações aleatórias:
- que povo do dente feio
- me deu gatinho aquelas garrafas passando de boca em boca
- o oclinhos é a coisa mais fofa e me lembrou aquele filme Pequeno Grande Time
- gostei muito de ver um grupo de professores de ensino médio pagando jantar chique, com caviar, na maior naturalidade.

Meu Pai é um filme muito bem feito. Tão bem feito que me arrancou temporariamente dessa tristeza da devastação coletiva e me colocou naquele cantinho do doer próprio da vida. Atuações sensíveis e Hopkins arrebata. Tipo quando a gente ralava o joelho e jogavam água oxigenada. Arde. Admiro demais esses velhinhos de filme que sempre lutam pra manter sua independência. Se eu tivesse um pouco mais de cara de pau e muito mais dinheiro contratava um cuidador pra mim agora mesmo. Claro que é aquele tipo de gracinha que eu faço quando alguma coisa me tocou muito fundo. Não dá pra saber quem tá mais confuso e desamparado, se pai ou filha. Filme incrível, tal como Amor, que traz muitos sentimentos e questões e nenhuma resposta (e pouco conforto).
Mank, que maravilha esse filme ter sido feito e que azar do Gary Oldman ter sido feito no ano em que Anthony Hopkins e Chadwick Boseman apresentaram interpretações praticamente imbatíveis. Mank é ácido, divertido, elegante, cínico, luxuoso, envolvente e um pouco falso, como a era de ouro de Hollywood que retrata. É também meu tipo de filme, por motivos diversos de Nomadland: é um filme de roteiro. Cada palavra, cada conversa, cada piada, tudo é consistente e cativante. O monólogo no jantar de aniversário, versando sobre a “modernização” de Quixote, é mesmo inesquecível. Confesso que esperava um pouco mais da proposta de filmar em P&B (sim, Roma me deixou mal acostumada) além de causar uma certa ambiência.

Relatos do Mundo: Um filme feito pra gente amar o Tom Hanks e apreciar seu perfil na contraluz... tá certo esse filme. Tom Hanks merece um Oscar por praticamente cada filme que fez e não é diferente nesse. A cena da mão tremendo me lembrou a cena do Antonio Banderas saindo do taxi em Dor e Glória, grandes atores conseguem passar tudo do personagem (história, idade, valores, sentimentos) em pequenos atos físicos. É um belo filme de jornada. Que as pradarias secas de um Texas de outro século sejam a metáfora para as agruras de encarar o que se é, como se é, com perdas e acertos, riscos e belezas, é uma escolha possível – e até certeira – mas não seria uma condição. Não precisava ser um western, escolheu ser. Foi um bom caminho.
A Voz Suprema do Blues é um filme maravilhoso. Tem quem não goste de cinema com cara de teatro. Eu gosto e, por mim, este acerta em quase tudo. A montagem é de tirar o fôlego, a trilha sonora é impecável, os diálogos fortes e envolventes, a direção sóbria, o figurino, a fotografia, o cenário, nada destoa muito do ponto mais forte: as atuações absurdas e embriagadoras de Viola e Boseman (acompanhadas com consistência por todo o elenco, inclusive o agente e o dono do estúdio que pegam um belo de um abacaxi pra descascar). Não é um filme fácil. É dolorido. Intenso. Não tem meia-palavra nem baixa o tom. É um grito de uma garganta já arranhada de gritar. Tudo é incômodo, inclusive o contraste entre as cenas dentro do estúdio e as incursões (super claras) fora do ambiente de gravação. Eu já tinha gostado demais de Fences e gostei ainda mais desse A Voz Suprema do Blues. Sou muito grata a este projeto do Denzel.
Como eu gosto do Mark Rylance. Essa é a primeira coisa que eu tenho a dizer sobre Os 7 de Chicago. A segunda é que o cinema é um troço muito poderoso. Isso que tá lá, na historinha, tá aqui do lado, aqui em frente, ao redor e sempre esteve. Mas o jeito de contar, os diálogos, as imagens, tudo isso é de muita força. A apresentação dos personagens é realmente sensacional, talvez seja a cena mais bem pensada do filme todo, inclui os diálogos, os planos, as atuações em um balaio colorido, rico, dinâmico. E compreensível. Li umas críticas (pareciam do Choque de Cultura) dizendo: muito diálogo. Bom, eu adoro filme de tribunal e esse é redondinho.
Era uma vez um sonho: eu amo os trabalhos da Glen Close e ela fez mais um trabalho estupendo. E talvez seja isso e mais nada que eu tenha a dizer de bom. É frustrante porque tinha tudo pra ser um ótimo filme (inclusive, pelo que li, o livro que foi adaptado é muito melhor que o resultado cinematográfico), mas se apega ao superficial, linear (apesar da montagem em zig zag) e ao caricato - não nas atuações, mas no texto raso e na condução da história, uma direção clichê e óbvia.
Tô na dúvida se vou atrás de algum almoço, se vejo Judas e o messias negro ou se tento de novo O Som do Silêncio #correndocontraotempo. E mais tarde vou acompanhar a cerimônia na TNT (televisão) e no notebook terei o Choque de Cultura (aqui o link do youtube) que, inclusive, estará com uma importante campanha, arrecadando doações para o projeto Tem Gente Com Fome. #VemGente
Tenho torcida, apesar de não ter visto tudo. Torcer não é achar que ganha, pelo contrário, meu coração não costuma bater junto com os dos votantes da Academia.