Newscoisa #63: aquela rosa e outros ensaios
Newscoisa #63: aquela rosa e outros ensaios
Há dentro de mim uma paisagem
entre meio-dia e duas horas da tarde.
(...) Quero escrever-te até encontrar
onde segregas tanto sentimento.
Pensas em mim, teu meio-riso secreto
atravessa mar e montanha,
me sobressalta em arrepios,
o amor sobre o natural.
O corpo é leve como a alma,
os minerais voam como borboletas.
Tudo deste lugar
entre meio-dia e duas horas da tarde.
(Adélia Prado)
Eu já ganhei flores um tanto de vezes. Não sei se já sorri assim. É a minha rosa.
Como na história antiga, teu coração no miolinho da rosa dentro de uma redoma de vidro, no interior de uma pedra, embrulhada em seda, guardada em uma bolsa, dentro de uma arca, no fundo do mar.
Sim, de vez em quando eu escuto os áudios e quase sinto o cheiro do rubro (isso nem é sotaque, é mandinga)
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Eu preparei tudo para aquele momento. Uma última vez? Uma única vez. Você, encabulado, na porta do meu quarto de hotel. Eu passo os dedos no seu cabelo, você me abraça, a gente se perde. A tarde passa pelas persianas, um cochilo de dedos entrelaçados. Ficar espiando seu rosto cansado, seu pequeno sorriso no intervalo entre sonho e acordar. O estranho conforto do silêncio no depois. As poucas palavras no trajeto. Andar sem mãos dadas. De almas dadas. As mãos só roçando no lado a lado do passo sintonizado sem ensaio. Suco e pastel também é comidinha para depois do amor, Vinícius? Pergunto do livro prometido, você me entrega, meio relutante, como se fosse o bilhete de despedida. Afago sua barba, você segura minha mão no seu rosto, alguém já lhe disse que seus olhos são sorvedouros escuros? Eu pisco. Não fazemos promessas. Nem de notícias. Você não sabe se pode, eu não sei se quero. O embaçado do seu olho e o embaraçado do meu rosto. Meios sorrisos. Acolheríamos a saudade futura como se ela já fosse antiga. O abraço desajeitado, toda despedida é em uma estação enevoada, mesmo naquele calçadão de revigorante ar marinho. Ia ser cálido, esse abraço. Eu preparei tudo para esse momento. Escolhi e ensaiei esta palavra para o texto que escreveria depois. Cálido. Cálido sobe morno do peito e desliza suave na língua. Cálido não tem arestas. Cálido é afeto que permanece nutrindo o peito para outros afetos. Virar devagar, antes que você entre no táxi. Seguir na calçada como quem se apresenta na corda bamba. Repetir baixinho, não olha pra trás, não olha pra trás, não olha pra trás, empurrar a porta de vidro do hotel, pedir na recepção pra trocar de quarto. Não olhar pra trás, não deixar vestígios. Eu tinha tudo preparado. Pena não ter combinado com os russos.
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A verdade é que estou precisando de mar. Deixar arder o sal nas feridas. Mergulhar e confundir maresia e lágrimas. Lavar a alma ou tirar a areia do biquíni, sei lá.
Eu só queria te trazer o riso. Fazer desejar. Queria fazer planos e vê-los brilhar nos teus olhos. Queria ser um intervalo. Um respiro. Ser dos que sabem os percursos subterrâneos do pra sempre justamente na ausência. Ser, em ti, um nem tanto. Só mais um pouco. O suficiente. O bastante. Dizer sim. Queria ser boa. Ser boa pra você. Acreditar que é possível ser bom pra alguém. Acreditar em qualquer coisa pessoal e íntima, extremamente gentil. Ser um deslizar de seda fria na pele quente. Ignorar o relógio, o calendário, os mapas e aquele grilo que fala ao meu ouvido a certeza da tristeza depois do adeus. O problema é essa beleza de Antártida. Imensidões brancas na alma, o vermelho de um céu que não se apaga e o silêncio tão absoluto que é a própria narrativa. A beleza - ou será o reflexo do sol no branco das geleiras?- me cega. Não há primavera pra esse território que batizei amor.

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Ela me deu essa música, tão precisa que me deixa tonta.
Tudo que não quero, não peço, não espero. Apenas:
lo que yo quiero corazón cobarde es que mueras por mi.
Y morirme contigo si te matas,
y matarme contigo si te mueres;
porque el amor cuando no muere mata,
porque amores que matan, nunca mueren.
