Newscoisa #91: Agora é o amanhã
Newscoisa #91: Agora é o amanhã
Lula eleito. Festa, festa, festa. Alívio, principalmente. E esperança. Não de que as coisas “vão dar certo”. Mas que há gente efetivamente trabalhando para fazer melhorar. Não só pra mim (mas pra mim também, ué), para muitos. Tantos. Segurança alimentar, proteção à infância, investimento em pesquisa, cobertura vacinal, suporte para projetos culturais, exemplos de coisas tão básicas às quais estávamos nos acostumando e que nos foram tiradas tão violentamente. Eu não serei oposição de dia 01, nem de dia 02 e, a bem da verdade, não espero ser oposição dia nenhum*. Primeiro porque eu mesma sou ninguém para achar que xingar muito no twitter faça qualquer diferença para a máquina, segundo porque eu imagino, aqui do meu cantinho, o devagar que serão as coisas, a força e empenho silencioso que terão que botar em cada ação para mexer o que, só na força da inércia, é o sistema pelejando para destruir e abater. Só pensar nas leis da física: um esforço pra fazer parar um imenso peso que vem ladeira abaixo. Parar e depois fazer recuar. Lula eleito, parece que já respiro melhor.
* guardadas as evidentes exceções
********************
Desde 2015 tenho me afastado de pessoas que vão defendendo o indefensável. Não tenho mais convivência – e não pretendo ter, nem mesmo de maneira protocolar – com alguns tios e primos. Gente que eu amava e que me desiludiu de tal forma que eu não consigo nem pensar em estar no mesmo ambiente sem sentir uma leve gastura. A família ficou menor sim. Mas não me sinto mais só. De jeito nenhum. Estreitei laços. Passei a admirar ainda mais os que resistiram. Sinto-me acompanhada e amada por aqueles com quem resisti. Pelos que me incitaram e inspiraram a sobreviver. Gente que se indignou, que lutou, que se emocionou, que se solidarizou, que trabalhou para que tantos pudessem atravessar os tempos sombrios e chegar a esse nosso hoje de esperança. Sinto aquele quentinho no peito de olhar pro lado e ver pais, irmãos, filho, cunhados. Saber aquelas primas valentes. Lembrar de tantos amigos pelo país todo, especialmente os que resistem lá onde é muito mais difícil resistir, onde a maioria é barulhentamente cruel.
****************************
Bolsonaristas: o que tenho a ver? Mas progressistas aí debaixo, uma reflexão com carinho: voto de gratidão é o caraleo. Botem a mão na cabecinha, dêem uma abaixadinha, opa, não, botem a mão na cabeça e pensem antes de destilar essa xenofobia condescendente (aproveitem e também se informem um pouco antes de chamar o Ciro ou o Tasso de coroné – especialmente assim, nessa forma caricata de escrita, tá?). O voto do povo do Nordeste é cálculo eleitoral, como o voto de vocês e dos demais grupos que vocês analisam. Escuta a fala da Dona Antônia, por exemplo:
Não é tão difícil. Existe carinho e gratidão pessoal pelo que foi feito durante os governos do PT? Sim. Gostamos do que aconteceu. Mudaram nossa vida os programas sociais, o Luz Para Todos, o Bolsa Família, o crédito para o pequeno produtor pelo PRONAF, o Seguro da Agricultura Familiar e por aí vai. Reconhecemos isso. E, ao reconhecer, projetamos mais e melhores projetos. Mais mudanças. Mais melhorias. E fazendo este cálculo – que é, também, comparativo, aliás – decidimos nosso voto. E lutamos por ele. Vivem de dizer que “o povo não tem memória”. Aí quando a tal memória se converte em escolha de caminho, opção de voto, a gente tem que ler por aí assertivas presunçosas que tratam como pueril ou imaturo esse tipo de voto. Sabe, nós não votamos pelo que os governos do PT fizeram, mas porque somos suficientemente espertos para ler a realidade concreta e discernir que o que se fez “fala” do que se pode vir a fazer. E se junto vai um tanto de riso, de lágrima, de abraço, de amor, é que não temos medo do afeto. Não temos medo do vínculo. Nos emociona, sim, lembrar de uma vida em que não se podia ter um nebulizador para um filho e não dava para conservar alimentos e saber a vida um pouco mais possível por causa de políticas públicas que realmente visavam ter cuidado com a população.
******************
Uma coisa que tem me impressionado muito nessas arruaças de bozolovers golpistas, contestadores do resultado das eleições e apavorados com a democracia, é a incapacidade de pensar de forma complexa. O horror e surpresa com que eles retratam a polícia (que tem agido da maneira mais gentil possível) jogando spray ou dispersando as aglomerações chega a ser engraçado: “olha só o que a polícia está fazendo com pessoas de bem, com trabalhadores”, chega a ser patético. Eles acham mesmo que podem cometer crimes e não sofrer nenhuma represália porque eles são “especiais, ungidos”, sei lá que merda eles acham que são. É próprio da extrema-direita desumanizar os demais, né? A polícia pode fazer isso – e pior – com estudantes, professores, trabalhadores em greve, comunidades indígenas, manifestantes se posicionando contra algum arbítrio judicial, reintegração de posse porque, olha só, nós não somos gente de bem e nem mesmo trabalhadores. A outra cosia que fica ali entre o patético e o grotesco é que eles vão pra rua, empunham bandeiras mas só se sustentados por outros (que, de sua mansão, bancam os baderneiros) e, principalmente, terceirizando sua luta. Eles esperam que a polícia, federal, militar, a que for, lute não apenas com eles, mas por eles. Se estão em uma situação de confronto em que a polícia faz o mínimo e não se mete (como quando os membros das torcidas organizadas vão desmontando os bloqueios) eles simplesmente correm, fogem, arregram. São arregoes. Sua convicção vai nem até a página dois e só se mantém enquanto eles acreditam que está protegida pelo poderio econômico e pelo uso da força alheia. Nunca ocuparam um Reitoria. Nunca acamparam em frente ao INCRA. Para ficar no mínimo. Não entendem o sufoco da logística e a coragem de resistir. E também não sabem nada de organização para proteger e cuidar dos outros, da sociedade. Não cuidam para fazer passar os doentes, por exemplo. Nem sinalizaram seus bloqueios grotescos e por isso morreu um homem, em acidente de carro, batendo em um caminhão parado, sem iluminação, sem nenhum tipo de aviso, sem marca ou indicação. Pelo perfil, inclusive, potencial eleitor do bozo. Nessas horas, o que é patético se torna uma outra coisa muito mais triste, sombria e eu lamento que os responsáveis não só nunca serão responsabilizados como também nem mesmo passarão o mesmo tempo - que eu passei –lamentando.
************************
Vamos falar de belezas? O Lula é um comunicador ímpar. Para além disso, a regularidade da precisão de forma e conteúdo dos seus discursos é admirável.
Ele não só sabe como dizer, mas sabe o que dizer e em que hora dizer.
Cada vez que ele pega em um microfone é um deslumbre.
Seu discurso logo após o TSE confirmar sua eleição foi essa maravilha aqui.
Pra se ler e reler, ouvir e novamente escutar e mais outra vez. Para lembrar. Para inspirar.
(colei o texto lá no meu blog)
*************
Tem coisas na minha vida que são muito, muito simples e descomplicadas.
Luciana, em quem você vai votar em 2026? No candidato do PT.
Mas o nome X e Y? Risos.